Perfil do processo dialítico em Minas – Helio Arêas – 2006

    Data de publicação: 14/11/2006

    PERFIL DO PROCESSO DIALÍTICO EM MINAS GERAIS (*)

    Dr. Helio Arêas

    O trabalho é o resultado de uma pesquisa epidemiológica realizada pelo autor nos Centros de Nefrologia em Minas Gerais, tendo como principal objetivo a verificação da qualidade da atenção dispensada aos pacientes portadores de doença renal crônica.
    Todos os 74 Centros de Nefrologia foram visitados pelo autor, no período compreendido entre setembro de 2005 e agosto de 2006, tendo entrevistado 864 pacientes que se encontravam em hemodiálise.
    A pesquisa teve, ainda, como objetivo paralelo a verificação das condições de trabalho dos médicos, de modo a avaliar a segurança para o exercício profissional; identificar as causas do baixo número de transplantes renais; observar as instalações e equipamentos das unidades dialisadoras; analisar os indicadores de avaliação das unidades; pesquisar o nível de satisfação dos usuários com a qualidade da assistência que lhes era prestada e verificar a aplicabilidade da legislação sanitária normativa.
    Entre os diversos resultados obtidos na pesquisa, o autor ressalta os seguintes:
    • É mínima a participação do setor público na assistência dialítica aos doentes renais crônicos, havendo predominância marcante do setor privado lucrativo;
    • As equipes multiprofissionais de diversos serviços de hemodiálise se encontram incompletas, com deficiente atenção aos usuários;
    • 92% dos pacientes em processo dialítico são assistidos pelo SUS e apenas 8% deles possuem planos de saúde. Há pequena predominância de pacientes do sexo masculino, com prevalência de pessoas na faixa etária compreendida entre 40 e 60 anos de idade;
    • A assistência prestada na Rede Básica de Saúde – RBS – aos portadores de diabete e de hipertensão é deficiente, porquanto somente 3,5% dos pacientes em diálise e que eram acompanhados na RBS chegaram ao tratamento renal substitutivo através da rede básica, enquanto 85% tiveram sua insuficiência renal crônica em fase terminal diagnosticada em serviços hospitalares de urgência, quando acometidos de uremia severa e o restante por nefrologistas de serviços especializados;
    • A diálise peritonial não é estimulada pelos centros de nefrologia, havendo 94% dos pacientes em hemodiálise e apenas 6% em diálise peritonial, dos quais 4% em DPAC e 2% em DPA;
    • Em relação às causas da doença renal crônica dos pacientes em hemodiálise, 33% dos pacientes foram acometidos de nefropatia hipertensiva, 23% de nefropatia diabética; 19% de glomerulonefrite crônica e o restante de causas diversas, entre elas a nefrite intersticial crônica, doença renal policística, lupus eritematoso, etc.;
    • Os serviços de nefrologia se encontram geograficamente mal distribuídos, havendo grande concentração nas regiões mineiras situadas abaixo do paralelo geográfico 17 e rarefação da terapia renal substitutiva acima daquele marco, exatamente a região mais pobre do Estado;
    • Há excesso de burocracia por parte dos órgãos governamentais na dispensação de medicamentos especiais e excepcionais para os pacientes em diálise, com sensível prejuízo para os usuários que têm seu quadro agravado pela demora observada no processo;
    • A Vigilância Sanitária não tem comportamento isonômico no Estado, havendo localidades em que há exigências absurdas e outros tolerâncias descabidas;
    • Entre os eventos adversos observados através dos indicadores de avaliação de desempenho das unidades de diálise, sobressaem-se a pirogenia e a soroconversão para hepatite C, havendo 14% dos serviços com taxa semestral de pirogenia entre 10 e 36% e quatro unidades com taxa semestral de soroconversão para hepatite C entre 10 e 20%;
    • Os serviços com melhores instalações e equipamentos são os privados lucrativos e são também os que apresentam melhores resultados através dos indicadores de avaliação.
    Em relação aos transplantes renais, a pesquisa revelou que 4330 pacientes em tratamento dialítico – cerca de 50% do total de pacientes – se encontravam inscritos nas Centrais de Notificação, Captação e Doação de Órgãos – CNCDO – aguardando um transplante do órgão. Embora o ingresso de pacientes no processo dialítico venha crescendo gradativamente, ano a ano, o número de transplantes não cresce na mesma magnitude. Em números relativos, os transplantes renais realizados em Minas Gerais são menores que os praticados no Rio Grande do Sul, Paraná e Pernambuco.
    Diversas causas do baixo número de transplantes em Minas Gerais foram detectadas no decorrer da pesquisa, entre as quais se sobressaem as seguintes: morosidade e excesso de burocracia nas CNCDO, número reduzido de laboratórios de imunogenética, carência de equipamentos para manter potenciais doadores em condições hemodinamicamente adequadas, repetidos insucessos em alguns centros transplantadores, fuga de pacientes para outros Estados em virtude de facilidades neles obtidas e não encontradas em Minas Gerais e inoperância das Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante – CIHDOTT.
    Por fim, o autor faz diversas considerações e sugestões para minimizar as dificuldades encontradas na terapia renal substitutiva pelos doentes renais crônicos, inclusive com a melhoria da tabela do SUS, adequação da legislação sanitária pertinente à realidade existente, melhoria no processo de dispensação de medicamentos especiais e excepcionais, entre outros.