Infecção recorrente em pediatria – Edward Tonelli – 1999

    Data de publicação: 10/08/1999

    INFECÇÃO RECORRENTE EM PEDIATRIA

    Edward Tonelli

    Resumo do Trabalho Científico apresentado pelo candidato à cadeira nº. 02 da Academia Mineira de Medicina, em 10/08/1999.

    RESUMO

    Introdução
    As infecções recorrentes, arrastadas e/ou atípicas, apesar de sua relevância na clinica pediátrica, infelizmente não têm sido abordadas de modo abrangente nos principais livros textos de pediatria. Excepcionalmente esse importante tema é registrado como capitulo em livros de doenças infecciosas na infância (Tonelli – 1987).
    Uma série de quadros clínicos relacionados com essa abordagem só se tornou melhor conhecida nas últimas duas décadas. Na realidade, foram significativos os avanços diagnósticos e terapêuticos a respeito desses quadros infecciosos recorrentes e de causa variada, que têm possibilitado melhoria da qualidade de vida e considerável redução da morbidade e dos índices de letalidade.

    A titulo introdutório serão mencionados os dois principais grupos de entidades clinicas relacionadas com os quadros de infecções recorrentes em crianças e adolescentes:

    1. Quadros de infecções recorrentes relacionados com entidades clínicas diversas, com destaque para:
    a. pneumonias de repetição e broncoespasmo recorrente relacionados com refluxo gastroesofágico, sobretudo em crianças de baixa idade;
    b. infecção urinária de repetição devida ao refluxo vésico-ureteral, mormente em lactentes;
    c. entidades clinicas diversas ligadas às amigdalites, adenoidites, otites e sinusites recorrentes ou arrastadas.

    2. Infecções recorrentes, arrastadas e/ou atípicas relacionadas com as imunodeficiências congênitas e adquiridas, caracterizadas por uma considerável gama de manifestações clinicas em diversos pontos do organismo, sobretudo nos aparelho respiratório, digestivo, na pele e no sangue.

    Convém ressaltar que os pediatras têm razoável tirocínio na abordagem das infecções recorrentes ligadas às patologias do grupo 1, ou seja, das entidades clinicas diversas já citadas mas, em geral, têm limitada experiência com aquelas do grupo 2, ou seja, com os distúrbios imunológicos congênitos desencadeantes desses quadros recorrentes, relativamente freqüentes na clinica diária.
    Em nosso país, no contexto da pediatria geral e da infectologia pediátrica em especial, temos, após alguns relatos pioneiros, nos dedicado, dentre outros temas, sobretudo ao diagnóstico e tratamento das infecções recorrentes, arrastadas e/ou atípicas ligadas às imunodeficiências, nos últimos 20 anos, no Serviço de Infectologia Pediátrica da Faculdade de Medicina da UFMG, que fundamos e coordenamos durante 18 anos. O referido Serviço constitui-se, na realidade, em centro de referência a nível estadual para esse tipo de patologias, dentre outras. Dentre algumas de nossas publicações sobre o tema, destaque especial para os quadros de infecções recorrentes ligados à hipogamaglobulinemia comum variável e às deficiências de subclasses de lgG (Tonelli et al. – 1992) e para os capítulos de livro (Tonelli – 1987, 1993 e 1998). O emprego bem sucedido do interferon alfa recombinante (Tonelli et al. – 1992) em uma paciente de nove anos, com baixa de interferon e com quadros de infecções respiratórias e urinárias de repetição há cerca de oito anos com insucesso terapêutico ou com controle parcial das manifestações clinicas, foi feito em caráter pioneiro e relatado como destaque em congresso. A publicação de Tonelli Jr. Et al. (1995)50, permitiu melhor compreensão a respeito do comportamento das subciasses de lgG, nos quadros de infecções recorrentes da hipogamaglobulinemia comum variável e trouxe, ainda, subsídios à terapêutica das imunodeficiências humorais.

    Conceito
    As infecções recorrentes, arrastadas e atípicas constituem importante capitulo da patologia pediátrica. Representam agressões constantes ao organismo da criança, com sérias repercussões sobre o crescimento e o desenvolvimento. Outro aspecto de relevo é que são causas freqüentes de consultas, internações e de uso repetido ou prolongado de antimicrobianos.
    De uma maneira geral, as infecções recorrentes são comumente localizadas nos tratos respiratórios, gênito-urinário e digestivo bem como na pele, no sistema nervoso central (SNC) e no sangue. São causas as mais diversas, mas as malformações e as imunodeficiências, dentre outras, devem ser consideradas na gênese desses processos.

    Abordagem
    Com base no exposto, é fundamental lembrar que a abordagem deverá ser sempre realizada em duas etapas. Na primeira são investigados os quadros de infecções recorrentes relacionados com entidades clinicas diversas e localizadas nos tratos respiratórios, gênito-urinário e digestivo, bem como na pele, no SNC e no sangue. Na segunda etapa, após a exclusão das causas da etapa anterior, são abordados os quadros de infecção de repetição ligados às imunodeficiências.
    Vejamos, então, a conduta prática referente a essas etapas.

    Infecções Recorrentes Ligadas a Entidades Clínicas Diversas

    Trato Respiratório
    A duração prolongada dos sintomas tosse ou chiadeira, a persistência de alterações radiológicas e a repetição de quadros pneumônicos são os critérios que isolados ou associados caracterizam a afecção respiratória crônica ou recorrente (Fernald – 1980). Contudo, devemos nos lembrar que as infecções respiratórias agudas podem repetir-se cerca de seis a oito vezes ao ano, sem que sejam consideradas crônicas.

    Trato Respiratório Superior

    Amigdalites recorrentes
    Esses quadros são causados geralmente pelo Streptococo beta-hemolitico do grupo A e decorrem comumente da inativação das penicilinas (penicilina G, bio e semi-sintéticas) e das cefalosporinas de primeira geração pelas beta-lactamases produzidas por germes da flora normal da garganta. Dentre esses germes merecem destaque: Staphylococcus aureus, Haemophilus influenzae e os anaeróbios (bacteróides melaninogenicus, oralis e rumnicula)7. as beta-lactamases rompem o anel beta-lactâmico dos antibióticos citados, uma vez que eles são vulneráveis à ação das referidas enzimas.
    É interessante ressaltar que no período de 1980 a 1989 alguns autores (Timon et al. – 1990) verificaram o aumento da presença do H. influenzae
    (39 a 62%) e do S. aureus (6a 40%), muitos deles produtores de beta-lactamases, nas camadas profundas das amigdalas.
    Nessas circunstâncias, isto é, diante dos quadros de amigdalites recorrentes por estreptococo beta-hemolitico do grupo A, ocorre geralmente discreta melhora clinica, recorrência a curtos intervalos ou até mesmo respostas medíocres após o uso de penicilinas e de outros beta-lactâmicos sensíveis às beta-lactamases. Diante dessa realidade a melhor alternativa tem sido a indicação da clindamicina em doses terapêuticas por 10 dias, o que tem evitado a indicação da amigdalectomia. É evidente que outros antibióticos poderão ser também indicados como a associação de amoxicilina + clavulanato de potássio, bem como a eritromicina ou a lincomicina. A clindamicina tem se mostrado superior aos dois últimos. Faltam estudos com os novos macrolideos.
    É importante lembrar que as hipertrofias amigdalianas decorrentes de amigdalites recorrentes pelo estreptococo beta-hemolitico do grupo A têm sido relacionadas freqüentemente com a presença de flora produtora de beta-lactamases na garganta. Por outro lado, certas hipertrofias amigdalianas não ligadas ao estreptococo beta-hemolitico, têm sido relacionadas também com a presença nas amigdalas de outras bactérias aeróbias (Branhamella catarrhalis) e Anaeróbias (Bacteróides sp), ambas produtoras de beta-lactamses (Brook e Yocum – 1988).
    Em todas essas circunstâncias em que as hipertrofias amigdalianas estão ligadas à presença de germes produtores de beta-lactamases nas amigdalas, a clindamicina ou a associação amoxicilina + clavulanato de potássio poderá ser prescrita e causar reversão do quadro. Daí a razão da acentuada redução da indicação de amigdalectomias nos casos de amigdalites recorrentes e de certas hipertrofias amigdalianas que estão ligadas à flora produtora de beta-lactamases.
    Na realidade, a indicação de amigdalectomia atualmente está restrita quase que somente áqueles casos de hipertrofias acentuadas, com obstrução mecânica, causando alterações do ritmo respiratório noturno (apnéia do sono). Esta indicada, também, em raros casos de amigdalites estreptocócicas recorrentes, em crianças maiores, que não respondem as tentativas mencionadas. Outras indicações: portadores de bacilo diftérico (de difícil erradicação) e abscesso periamigdaliano.

    Adenoidites recorrentes
    Esses quadros caracterizam-se geralmente por respiração bucal ruidosa, secreção nasal purulenta e voz anasalada. Durante a noite as crianças dormem geralmente com a boca entreaberta, e muitas vezes apresentam crises de engasgo, em decorrência da obstrução. As crises podem ser isoladas, mas comumente se associam às amigdalites recorrentes e a processos alérgicos. Quando isto ocorre, a adenoidite crônica de fundo alérgico é um importante fator coadjuvantae de otite crônica ou recorrente, em decorrência da obstrução do óstio e da tuba auditiva.

    Quando esses quadros se arrastam por longo tempo, são responsáveis por deformação da arcada dentária e pela “fácies” adenoideana. Os germes responsáveis geralmente são os mesmos da amigdalite recorrente, inclusive anaeróbios. O diagnóstico é feito com base em dados clínicos, no exame otorrinolaringológico e no Rx de perfil do pescoço.
    O tratamento é feito com o emprego de antimicrobianos (amoxicilina) por aproximadamente 10 dias, e de descongestionantes nasais tópicos, além, evidentemente, do controle de ambiente. É fundamental manter as vias aéreas desobstruídas para drenagem das secreções nasais, dos seios da face e da tuba auditiva.
    A indicação de adenoidectomia poderá ser feita com base em opinião de otorrinolaringologista, sendo reservada sobretudo para crianças maiores, uma vez que o tecido linfóide cresce na infância até os 12 anos de idade, quando tem inicio a regressão do mesmo. Quando ocorre obstrução respiratória grave e hipoventilação, a adenoidectomia está sempre indicada. Este tipo de cirurgia está bem indicada nos casos de otite média aguda recorrente ou crônica, que não responderam a implantação dos tubos de timpanostomia (carretel).

    Sinusites recorrentes
    Os quadros de sinusite em crianças, ao contrário do que ocorre em adultos, geralmente não se manifestam com dor. Acompanham freqüentemente os quadros alérgicos (rinossinusopatia alérgicas) e/ou as infecções das vias aéreas superiores. Caracterizam-se comumente pelos seguintes sintomas e sinais: tosse relacionada ou não com decúbito, pigarro, descarga nasal, resfriado permanente, modismos, prurido nasal e espirros em salva. Os germes comumente identificados são o H. influenzae, o S. aureus, a B, catarrhalis e anaeróbios, muitos deles produtores de beta-lactamases, e o peneumococo.
    O diagnóstico é feito com base em dados clínicos e exames subsidiários. Dentre esses o estudo radiológico é fundamental, sendo classicamente feito em três posições: mento-naso-placa (Waters), fronto-naso-placa (Caldwell) e perfil. A tomografia poderá trazer subdidio ao diagnóstico.
    O tratamento é feito com amoxicilina associada ou não ao clavulanato de potássio, com eritromicina ou lincomicina ou, ainda, com a associação sulfametoxazol + trimetoprim, por cerca de 14 dias. Outras medidas: combate à causa alérgica (controle de ambiente) + dipropionato de beclometasona, fisioterapia respiratória.

    Otites recorrentes – Otite Média Aguda Recorrente ou Crônica.
    Por otite média aguda recorrente (OMAR) ou crônica entende-se aquela entidade que se manifesta além de três vezes no período de seis meses, ou além de quatro vezes no período de um ano. Durante o episódio agudo os pacientes se apresentam com febre, otalgia, irritabilidade e sono intranqüilo. O exame otoscópico evidencia membrana timpânica hiperêmica, abaulada e com perda de brilho. Nota-se também, perda das referencias anatômicas. Quando há secreção no ouvido médio, ocorre redução da mobilidade timpânica. Na otite crônica, o tímpano se apresenta opaco, sem brilho e às vezes, com retração e perfuração (central ou marginal).
    Em cerca de 30 a 50% dos casos de OMAR, os germes identificados são: pneumococo, H. influenzae e B. catarrhalis, sendo que os dois últimos em cerca de 20 a 30% dos casos são produtores de beta-lactamases.
    Os antimicrobianos comumente prescritos na terapêutica da OMAR são a amoxicilina, associada ou não ao clavulanato de potássio, a associação sulfametoxazol + trimetoprim ou, ainda, uma cefalosporina de 2a geração.
    Na gênese da OMAR alguns pontos devem ser ressaltados, uma vez que possibilitam a melhor compreensão desse importante quadro clinico na prática pediátrica.
    a. Em se tratando de OMAR de caráter familial, tem-se identificado o antígeno HLA-A2, em maior proporção, entre os pacientes com o referido quadro, do que em grupos controles.
    b. A OMAR ocorre, sobretudo em pacientes que apresentaram o primeiro episódio, nos primeiros seis meses de vida.
    c. Má função da tuba de Eustáquio, uma vez que em crianças de baixa idade ela não propicia proteção efetiva contra líquidos oriundos da rinofaringe. Ademais, quando em decúbito horizontal, a criança fica com a tuba verticalizada, ao passo que os movimentos de deglutição possibilitam a penetração de alimentos em seu interior, com conseqüente processo inflamatório.
    d. Muitos pacientes com OMAR exibem, no primeiro ano de vida baixos níveis de anticorpos antipneumocócicos 6A e 19F, quando comparados com grupos controles34.
    e. Em crianças normais é freqüente a colonização da nasofaringe por cepas não tipaveis de H. influenzae. Este achado talvez explique a alta freqüência de otites pelos referidos germes, durante episódicos de infecções das vias aéreas superiores.
    f. A ineficácia terapêutica observada após emprego da amoxicilina e de outros beta-lactâmicos é facilmente explicada pela presença de germes produtores de beta-lacatamases, como o H. influenzae, B. catarrhalis e os anaeróbios.
    g. No tratamento da OMAR ou crônica é fundamental estar atento, também, ao tratamento da adenoidite concomitante. Esta, muitas vezes, é fator predisponente da OMAR. Daí a importância de manter desobstruídas as vias aéreas, para a correta drenagem das secreções nasais, dos seios da face e da tuba auditiva.
    h. A amigdalite recorrente não é fator predisponente da OMAR ou crônica. Daí a razão de estar contra-indicada a amigdalectomia para o controle da OMAR.
    Como medida preventiva da OMAR já esta comprovada5 a eficácia do emprego da amoxicilina ou de sulfametoxazol + trimetoprim, em duas doses diárias, durante dois a quatro meses. Cada dose corresponde a 50% de uma dose usual desses produtos. O esquema poderá ser repetido, caso necessário.
    Quando os resultados são satisfatórios, a despeito da prevenção e tratamento corretos, cabe evidentemente uma abordagem imunológica que deverá ser feita oportunamente, conforme cada caso. Na verdade muitos casos de OMAR têm sido relacionados com deficiência de lgA ou de subclasses de lgG. Temos verificado nos últimos anos vários casos de OMAR e de amigdalites recorrentes ligados à deficiência de lgG.247, lgG3 e de lgG4.
    Portanto os pacientes com OMAR ou crônica que não têm um substrato imunológico ou que não respondem à prevenção e terapêutica já mencionadas, bem como os casos de otite secretora ou com efusão são candidatos a implantação de tubos de timpanostomia (carretel), o que é feito por otorrinolaringologista experiente, após, evidentemente, a realização da timpanometria. Através desta avalia-se a função das membranas timpânicas em relação às pressões em ambos os sentidos, quando o tímpano se mostra com pouca ou nenhuma mobilidade e com pressão negativa no ouvido médio, deve-se recorrer à implantação dos tubos. Neste particular, as crianças em idade escolar e com baixa de audição e atraso na fala em decorrência do processo da OMAR, merecem cuidado especial. Quando a implantação dos tubos não resolve o problema, há um certo consenso no sentido de indicação da adenoidectomia31, que tem se revelado medida eficaz no controle da OMAR ou crônica, purulenta ou não.
    Convém ressaltar que a implantação dos referidos tubos pode estar relacionada com algumas complicações e seqüelas, tais como perfuração e atrofia da membrana timpânica e Timpanoesclerose. Daí a razão de se dar preferência à prevenção prolongada com antimicrobianos, antes de se recorrer à implantação dos referidos tubos.
    Finalizando esse interessante tópico lembramos que o colesteatoma surge como complicação da otite crônica supurada. Resulta da migração do epitélio externo para o ouvido médio. Caracteriza-se por secreção fétida, que drena pelo orifício marginal. Pode descamar em camadas como “casca de cebola”. Ocorre infecção bacteriana e é resistente ao tratamento. Pode evoluir e atingir os ossículos e estruturas vizinhas. O tratamento é cirúrgico geralmente.

    Trato Respiratório Inferior
    Os principais quadros infecciosos recorrentes das vias respiratórias inferiores estão representados pelas pneumopatias de repetição ou crônicas, tais como:
     Pneumopatias crônicas comuns em nosso meio, como asma e tuberculose;
     Patologias que levam à aspiração pulmonar, como fistulas traqueo-esofágicas, refluxo gastroesofágico funcional ou devido à hérnia de hiato; são ainda importantes as doenças neurológicas como paralisia cerebral e a incoordenação motora da musculatura faríngea;
     Condições de natureza sistêmica como raquitismo, cardiopatia congênita com hiperfluxo pulmonar, mucoviscidose e imunodeficiências;
     Processos de atelectasias, sobretudo do lobo médio e da língula; bronquiectasias e formação de abscesso são fatores de ordem local que comumente são causas de evolução arrastada da doença pulmonar.

    O diagnóstico das pneumonias de repetição está baseado em dados de anmnese e nos seguintes exames:
     Estudo radiológico de tórax, Raios X contrastados (fistula traqueo-esofágica, refluxo gastroesofágico, hérnia de hiato, bronquietusia, incoordenação motora da musculatura faríngea);
     Exame radiológico de ossos longos, dosagem de fósforo, cálcio e fosfatase alcalina (raquitismo);
     Dosagem de eletrólitos no suor (mucoviscidose);
     Cateterismo e outros exames (cardiopatia congênita). A cintilografia tem se mostrado útil em casos de pneumonias recorrentes localizadas.

    A terapêutica será conduzida de acordo com o diagnóstico em cada caso.

    Trato Gênito-Urinário
    As malformações e o refluxo vésico-ureteral (RVU) são as principais causas de infecções de repetição das vias urinárias. As malformações são freqüentes e localizadas no trato gênito-urinário superior e inferior. Dentre elas podem ser mencionadas: hipoplasia renal, doença policistica, estenose da junção pieloureteral, megaureter, ureterocele, anomalias da uretra (estenose do meato uretral, da uretra distal em meninas, fimose, estenose congênita da uretra masculina, divertículos da uretra, válvulas da uretra posterior), anomalias vesicais etc. O refluxo vésico-ureteral é decorrente de disfunção anatômica na junção uretero-vesical. Pode ser conseqüente a um processo inflamatório, a infecção urinária, a um defeito congênito do conjunto anatômico na junção uretero-vesical ou, ainda, a processo obstrutivo infravesical. É interessante salientar que a junção ureterovesical está em desenvolvimento nos primeiros dois anos de vida e que a partir dessa idade poderá ocorrer desaparecimento espontâneo do refluxo, na maioria dos casos. A existência concomitante de refluxo intra-renal (cálice-papila) é, talvez, fator primordial para o aparecimento de cicatrizes, que são de natureza irreversível, com tendência a progressão.
    A infecção urinária manifesta-se através de febre isolada e ocorre em 80 a 90% dos pacientes com RVU. Já a incidência de RVU em crianças com infecção urinária varia de 35 a 55%. A nefropatia do refluxo é a causa mais comum de hipertensão e insuficiência renal na infância, e no adulto ela é responsável por aproximadamente 20% das hipertensões graves.
    Há cinco graus de refluxo:
    Grau I ………. Refluxo restrito ao ureter;
    Grau II ………. O refluxo atinge o sistema pielocalicial;
    Grau III ……… Dilatação uretero-piélica discreta;
    Grau IV ……… Dilatação uretero-piélica acentuada;
    Grau V ………. Ureter redundante com grande dilatação da pélvis.

    O diagnóstico do RVU é baseado em dados clínicos e no estudo radiológico, urografia excretora e cistouretrografia miccional.
    O tratamento conservador é recomendado para os refluxos de graus I, II e com endoscopia favorável. Observa-se desaparecimento espontâneo do RVU com o crescimento da criança, em decorrência da maturação da junção uretero-vesical. É de bom alvitre, contudo, prevenir lesões renais, evitando-se a infecção urinária através da quimioterapia prolongada supressiva. Esta é mais eficaz que a quimioterapia intermitente, na prevenção da recidiva da infecção e no aparecimento de outras lesões.
    O tratamento cirúrgico recomendado para os RVU de graus IV e V visa corrigir a junção uretero-vesical e impedir as lesões renais.
    Quando não se consegue controlar a infecção urinária ou se a recidiva for freqüente, apesar da quimioterapia, a indicação da cirurgia deve ser formal. Independente da conduta tomada, o segmento criterioso e prolongado é fundamental: uroculturas, reavaliações periódicas anatômicas e funcionais do rim e do trato urinário (radiologia, ultra-sonografia e medicina nuclear). Nos casos rebeldes a suspeita de imunodeficiência deve ser sempre lembrada.

    Sistema Nervoso Central
    Á semelhança do que ocorre com os tratos respiratório e gênito-urinário, as malformações do SNC – meningomielocele e outras – são causas de infecção recorrente (meningites). Os traumatismos de crânio com posterior rinorréia liquórica são comumente responsáveis por meningite pneumocócica recorrente.
    No diagnóstico dessas afecções é fundamental o exame clinico-anamnese, exame físico – o estufo radiológico e a tomografia. A terapêutica será conduzida conforme cada caso. Convém frisar que nos últimos anos vários autores têm recomendado a correção cirúrgica de miningomielocele no primeiro ano de vida, com o fim de se evitar a contaminação do tecido nervoso exposto.

    Sangue
    As infecções recorrentes no sistema sangüíneo são manifestações de quadros septicêmicos, que ocorrem, com freqüência, nas imunodeficiências, que serão abordadas a seguir:
    Terminada a exploração diagnóstica dos quadros de infecção recorrente ligados a entidades clínicas diversas (etapa nº 1), passaremos, agora, à etapa seguinte, isto é, à abordagem dos quadros de infecção de repetição devidos às imunodeficiências.

    INFECÇÃO RECORRENTE, ARRASTADA E ATÍPICA LIGADA ÀS IMUNODEFICIÊNCIAS.

    Introdução
    As imunodeficiências 44,47 são quadros clínicos relativamente freqüentes na infância e se caracterizam, sobretudo, por infecções recorrentes principalmente da árvore respiratória, do trato intestinal e da pele. É evidente que além das infecções de repetição, as imunodeficiências se acompanham comumente de manifestações clinicas próprias, que facilitam sobremaneira o diagnóstico. Por outro lado, convém lembrar que a deficiência imunológica mais freqüente é o déficit seletivo de lgA (aproximadamente 1/800 pessoas)41, e que pode ocorrer sem nenhuma manifestação clinica. Um déficit de lgG2 associado à deficiência seletiva de lgA é observado em cerca de 20% dos casos, explicando muitas vezes, o quadro de infecções recorrentes por bactérias virulentas capsuladas (Haemophilus influenzae, menigococo, pneumococo dentre outras).
    Os clínicos, sobretudo os pediatras, devem incluir sempre no diagnóstico diferencial das infecções de repetição a possibilidade de imunodeficiências, ao lado dos quadros já anteriormente abordados (etapa nº 1). É fundamental ter em mente que o diagnóstico de uma imunodeficiência é relativamente simples e que, na maioria das vezes, não existe terapêutica eficaz.
    Os casos de hipogamaglobulinemia (baixa deIgG) e aqueles que se acompanham de baixos níveis de certas subclasses de igG, constituem aqueles que respodem bem ao tratamento com imunoglobulinas.
    São fundamentais para o conhecimento das imunodegiciências algumas noções básicas sobre os mecanismos de defesa, que serão mencionados de maneira sumária.
    O estado de saúde depende, em grande parte, do grau imunidade, ou seja, dos mecanismos de defesa, que são classificados em primários e secundários. Dentre os primários, responsáveis pela imunidade natural ou inespecífica, podem ser mencionados os seguintes elementos: lisozima, ácidos graxos da pele, sistema linfático (função de filtro), complemento, interferon, polimorfonucleares e macrófagos. Os mecanismos secundários são aqueles que respondem pela imunidade adquirida ou específica. Dentre os elementos secundários destacam-se os anticorpos produzidos pelos linfócitos B e plasmócitos, que respodem pela imunidade humoral, ou bursa-dependente, e os linfócitos T, que produzem linfocinas, responsáveis pela imunidade celular, retardada ou timo-dependente. Os medidores quimicos da umunidade humoral são os anticorpos (lgG, lgA , lgM, lgD, e lgE) e os da imunidade retartadas são as linfocinas (fator de transferência, fator de inibição do macrófago e vários tipos de interleucinas como lL-l, lL-ll dentre outras) .
    É interessante ressaltar que há certa interação entre os mecanismos primários e secundários. A fagocitose, por exemplo, é importante mecanismo primário de defesa, já presente em organismos primitivos. Participam desse processo os polimorfonucleares e o macrófago, que englobam bactérias não viruletas com facilidade; porém, diante de bactérias virulentas capsuladas (pneumococo, hemófilos dentre outras), o processo só se realiza com a participação do complemento e das opsoninas, sendo estes elementos secundários de defesa que cooperam com os elementos primários, durante a fagocitose. Por outro lado o, macrófago, componente dos mecanismos primários, colabora comumente com o linfócito T no processamento do antígeno da imunidade celular e é também elemento intermediário no processo de cooperação do linfócito T com o linfócito B.
    Com certa freqüência, a resposta imunitária inespecifica é suficiente na eliminação de corpos estranhos (antígenos). Quando isso não ocorre, são ativados os mecanismos secundários, que comumente eliminam os produtos antigênicos. Caso isso não se verifique, persiste o estimulo antigênico e são ativados os mecanismos de hipersensibilidade (tipos I, II, III, IV), que muitas vezes não se acompanham de manifestações clinicas. Finalmente, quando todos os mecanismos de defesa são vencidos, surgem quadros mais graves, como infecção recorrente, alergia, auto-imunidade e as neoplasias, conforme evidente a Figura 1.

    • A = Antígeno
     P = Persistência do Antígeno
     = R = Resistência do Organismo (eficácia dos mecanismos de defesa )

    IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS

    Quadro clínico
    As infecções recorrentes, arrastadas ou atípicas de qualquer natureza¬-bacterianas, viróticas, fúngicas e parasitárias – constituem, na realidade, a principal manifestação clínica das imunodeficiências. Têm certa preferência para localização nos tratos respiratório, digestivo, gênito-urinário e na pele, embora se manifestem também, em menor proporção, em outros setores do organismo, como no sistema nervoso central e no sangue.
    As pneumonias; otites, amigadlites recorrentes e a diarréia crônica são quadros freqüentemente observados na hipogama comum variável e na agamaglobulinemia tipo Bruton. A hipogama comum variável é relativamente freqüente em nosso meio, muitas vezes em membros de uma mesma família, enquanto que a agamaglobulinemia tipo Bruton é extremamente rara em todo o mundo.
    A deficiência seletiva de IgA, considerada o tipo mais freqüente de imunodeficiência (1/800),Caracteriza-se por surtos recorrentes de amigdalite, otite e pneumonia e, muitas vezes, por giardíase de repetição. Contudo, convém lembrar que muitos portadores dessa imunodeficiência são totalmente assintomáticos.

    Classificação das imunodeficiências
    A) PRIMÁRIAS
    Deficiências de imunidade humoral
    Hipogamaglobulinemia ligada ao sexo (Bruton)
    Hipogamaglobulinemia ligado ao sexo com hiper-lgM
    Imunodeficiência comum variável
    Deficiência seletiva de IgA
    Deficiência seletiva de IgM
    Hipogamaglobulinemia transitória da infância
    Deficiência de subclasse de IgG

    Deficiência da imunidade celular
    Aplasia (hipoplasia) congênita do timo (Di George)
    Candidíase mucocutânea (com ou sem endocrinopatia associada)

    Deficiências combinadas de imunidade humoral e celular
    Imunodeficiência grave combinada
    Imunodeficiência celular com síntese anormal de imunoglobulinas (Nezelof)
    Síndrome de Wiskott-Aldrich
    Ataxia-telangiectasia
    Imunodeficiência com timoma
    Imunodeficiência com nanismo e membros curtos
    Imunodeficiência com deficiências enzimáticas
    Defeitos da fagocitose
    Doença granulomatosa crônica
    Deficiência de G6PO
    Deficiência de mieloperoxidase
    Síndrome de Chediak-Higashi
    Síndrome de Job
    Neutropenias congênitas (cíclicas ou não-cíclicas)

    Defeitos da quimiotaxia
    Síndrome de leucócito preguiçoso
    Defeito da quimiotaxia associado a eczema e hiper-lgE
    Defeito da quimiotaxia associado a eczema, hiper-lgE e craniostenose Síndrome de Chediak-Higashi
    Deficiências do sistema do complemento

    Defeitos do complemento
    Deficiências de C1, C2, C3
    Deficiência do inativador de C1 (angioedema hereditário)

    B) SECUNDÁRIAS
    Imunidade natural
    Leucopenia (drogas imunossupressorres, infecções)
    Deficiência de C3 (como na glomerulonefrite difusa aguda)

    Imunidade específica
    Deficiência humoral (imunossupressores, infecções congênitas, parasitoses, desnutrição) Deficiência celular (viroses, micoses, parasitoses, desnutrição, neoplasia, imunossupressores, infecções congênitas)
    Síndrome da imunodeficiêllGia adquirida (AIDS) – vírus HIV
    0BS: incidência entre as primárias: deficiência humoral (50%), deficiência celular (10%), deficiência celular + humoral (30%), deficiência da fagocitose e da quimiotaxia (6%), deficiência do complemento (4%) Fonte.41
    As deficiências de subclasse de IgG (lgG1, IgG2, IgG3, IgG4) também se manifestam por afecções recorrentes da árvore respiratória. Temos identificado vários casos de deficiência de IgG2 (Tonelli et aI. – 1992), IgG3 e de IgG4 ligados a quadros de otite e amigdalite recorrentes, nos últimos seis anos.
    Nas imunodeficiências celulares são comuns os seguintes quadros clínicos: candidíase recorrente, micoses profundas graves, toxoplasmose e mononucleose graves ou arrastadas, dentre outras. A toxoplasmose adquirida e certas micoses de localização no SNC sugerem a possibilidade diagnóstica de AIDS.
    As imunodeficiências humorais e da imunidade natural se acompanham de quadros recorrentes de infecções bacterianas. Já as imunodeficiências mistas, sobretudo congênitas ou primárias, são relativamente raras. Como exemplo podemos citar a síndrome de Wiskott-Aldrich, que se caracteriza por déficit celular e baixa de IgM, e a síndrome de Nezeloff que se acompanha de déficit celular e humoral.
    Além das infecções recorrentes as imunodeficiências se manifestam, também, através de quadros clínicos próprios, que facilitam o diagnóstico. É o caso do albinismo na doença de Chediak-Higashi, da púrpura trombocitopênica na síndrome de Wiskott-Aldrich, dos abscessos frios na síndrome de Job e da ataxia e telangiectasia na imunodeficiência que se caracteriza por ataxia, elangiectasia e por deficiência de IgA, estando esta presente em cerca de 80% dos casos. os quadros 3, 4, 5 e 6 acham-se. as manifestações clínicas das principais imunodeficiências.

    DIAGNÓSTICO
    O diagnóstico das imunodeficiências é baseado em dados clínicos e laboratoriais e feito, na maioria dos casos, em regime ambulatorial. De maneira geral, infecções repetidas por bactérias virulentas capsuladas podem estar relacionadas com as deficiências humorais e quantitativas da imunidade natural. Por outro lado, infecções recidivantes devidas a fungos, vírus, protozoários (Toxoplasma), bacilo de Koch e a certas bactérias intracelulares são manifestações significativas das imunodeficiências celulares. Cumpre ressaltar que a imunodeficiência mais freqüente, a imunodeficiência seletiva de IgA (1/800), é pouco diagnosticada. Isto talvez decorra da falta de hábito de se pensar “imunologicamente”, diante de pacientes com quadros de infecções recidivantes.
    Convém frisar que, em toda avaliação imunológica, são imprescindíveis o leucograma, a eritrossedimentação e a proteína C reativa, antes de se recorrer a outros exames. O leucograma fornece subsídios importantes ao diagnóstico das leucopenias congênitas ou adquiridas, das infecções bacterianas em geral e das deficiências celulares. Nestas, o número de linfócitos é geralmente inferior a 1500/mm3. Já a eritrossedimentação e a proteína C reativa são fundamentais na avaliação da resposta inflamatória.

    IMUNODEFICIÊNCIAS HUMORAIS E DA IMUNIDADE NATURAL
    As manifestações clínicas comuns a essas imunodeficiências são as infecções recorrentes causadas por bactérias de alta ou baixa virulência. As imunodeficiências humorais são bem mais freqüentes que as da imunidade natural.

    Exames principais no diagnóstico das deficiências humorais 12, 29
    1. Dosagem de imunoglobulinas: é realizada pela técnica da imunodifusão radial e por outras. A maturação imunológica com relação às imunoglobinas ocorre em épocas diferentes: IgM, a partir de um ano de vida, IgG, a partir de quatro anos e IgA, após oito a nove anos. A dosagem de subclasses de IgG (lgG1, IgG2, IgG3, IgG4) é importante, pois nas deficiências de IgG2, IgG3, IgG4 o resultado da IgG total não se altera, uma vez que as referidas subclasses são encontradas normalmente em níveis baixos, não repercutindo, portanto, na dosagem total da IgG; já a baixa de IgG1 (60 a 70% da IgG) repercute francamente no resultado da IgG, que se apresenta em níveis muito baixos (normal de 800 a 1600mg%). A dosagem de imunoglobulinas pode ser feita também por nefelometria. A dosagem de subclasse de IgG no soro e; dos baixos níveis de IgA nas secreções deve ser feita por radioimunoensaio e pela técnica de Elisa. A imunodifusão radial e o radioimunoensaio são boas técnicas para IgG1 e IgG2, mas não se mostram muito sensíveis para IgG3 e IgG4.
    2. Tipagem de linfócitos B12 – normal = 14,8% +- 8,2%, esse exame não deve ser isolado, em preceder a dosagem de imunoglobulinas.
    3. Avaliação da produção de anticorpos 12
     Dosagem de anticorpos específicos, após imunização com antígenos diftérico, tetânico, B. pertussis, bem como polissacarídeos de pneumococos, N. meningitidis e antígeno de vacina antitifoídica. Após aplicação desta, os anticorpos anti-H (lgG) e anti-O (lgM) são encontrados em títulos superiores a 1/40.¬
     Em crianças previamente imunizadas (sarampo, pólio e rubéola),avalia-se a produção de IgG. Os títulos inferiores a 1/8, geralmente indicam deficiência na produção de anticorpos.
     Teste de Shick – deve ser negativo (presença de anticorpo neutralizador) em crianças vacinadas contra difteria. O teste positivo (antitoxina não detectável) é considerado anormal se o paciente foi vacinado dentro do período de dois anos.
     Determinação de iso-hemaglutininas (lgM) – Os anticorpos anti-A e anti-B, presentes em indivíduos de grupos sangüíneos A, B e O, chamados anticorpos naturais, sendo encontrados em todos os indivíduos normais, com títulos de 1/10, são devidos à presença destes antígenos nos alimentos, em partículas inaladas, e nas floras digestiva “e’ respiratória. As’ :Iiso-“hefliaglutininas são geralmente indetectáveis no sangue de ‘cordão, estão ausentes em cerca de 50% dos lactentes aos seis meses de idade e, em 10% dos mesmos, no final do primeiro ano de vida.

    Exames fundamentais na avaliação das principais deficiências da imunidade

    natural12. 26
    1. NBT (nitroazul de tetrazol): é o teste que possibilita verificar a capacidade de o fagócito digerir a bactéria e reduzir o corante nitroazul a formazam. Somente os polimorfonucleares que fagocitam e digerem as bactérias são capazes de reduzir o referido corante. Trata-se de exame fundamental no diagnóstico da Doença Granulomatosa Crônica (DGC), em que o resultado é igual ou próximo de O, Em indivíduos normais, o resultado do NBT é de 10% a 20%; nas infecções bacterianas com leucocitose, o resultado é de 60% a 80%. Nas viróticas é normal. É exame de certa utilidade na diferenciação entre infecções viróticas e bacterianas da árvore respiratória.
    2. Quimiluminescência: através deste teste, verifica-se que neutrófilos normais produzem luz quimicamente, durante a facocitose. Na DGC, não ocorre produção de luz, durante a fagocitose de bactérias opsonizadas.
    3. Dosagem de C3 (120mg/dl) e C total (180-240 U).
    4. Outros exames: avaliação da quimiotaxia (Câmara de Rebuck in vitra e ensaio em câmara de Boyden in vitra). A fagocitose é avaliada com partículas de zimosan, e a atividade bactericida in vitra, com utilização de microorganismos – Escherichia coli e Staphy/ococus aureus.

    Imunodeficiência celular 12
    Diante da suspeitá de deficiência celular (infecções recorrentes por vírus, fungos, toxoplasma, bácilo de Koch, Brucella, Listeria e Gram-negativos), os seguintes exames deverão ser requisitados:

    “As infecções recorrentes” arrastadas ou atípicas, por vírus, protozoários (toxoplasma), bacilo de koch, bactérias intracelulares (Listeria, Brucella) e por Gram-negativos são pistas importantes para o diagnóstico das imunodeficiências celulares46

    Imunodeficiências celulares
    Clínica: Infecções recorrentes por vírus, fungos (Candida), toxoplasma bactérias intracelulares e Gram¬ negativos.
    Grupo: Celular
    Sub-grupo: Síndrome Di George Candidí¬ase mucocutâ¬nea
    Dados importantes: Aplasia tímica, hipo¬paratireoidismo, Infecções recidi¬vantes por Candida (pele e mucosas).
    Exames principais: 1-Leucograma: linfopenia (menos de 1.500 linfócitos/mm3) 2-Testes cutâneos 3- Tipagem de lincófitos T 4-Radiografia de tórax: imagem tímica reduzida ou ausente no recém-nascido
    Tratamento: Transplante de timo fetal ou medula, Fator de transferência.

    Exames importantes nos três tipos de imunodeficiências mistas:
    1. Leucograma: verificar linfopenia (menos de 1.500 linfócitos/mm3)
    2. Testes cutâneos: resultados geralmente negativos.
    3. Radiografia de tórax: pode ser observada imagem tímica reduzida ou ausente no recém – nascido.
    4. Tipagem de linfócitos T ou B: normal: L T = 60-70% e LB = 14,8+ 8,2%.

    1. Leucograma: número de linfócitos inferior a 1.500/mm3 geralmente sugere deficiência celular.
    2. Testes cutâneos: os resultados dos testes PPD, histoplasmina, candidina e toxoplasmina dependem de infecção anterior e, quando positivos, forma-se uma pápula maior que 5mm, a partir de 48 horas após a aplicação. Se um desses testes for positivo, está praticamente afastada a possibilidade de deficiência celular. Geralmente há certa correlação entre o número de linfócitos e o resultado dos testes cutâneos, pois estes sempre estão negativos, quando a linfopenia é acentuada. Outros testes cutâneos raramente utilizados, mesmo assim, somente pelo imunologista: ONCB (dinitrocloro-benzeno) e PHA (fito-hematoaglutinina).
    3. Radiografia de tórax: imagem tímica reduzida ou ausente em recém¬ nascidos com deficiência celular.
    4. Tipagem de linfócitos T (CO3): normal de 60-70%. É importante na avaliação de imunidade celular, porém não deve ser isolado, nem preceder a realização de testes simples e importantes, como o leucograma e os testes cutâneos. Subpopulação de linfócitos T: CO4 (auxiliar, indutor ou helper) e CO8 (supressor ou citóxico). A relação CO4/CO8 em crianças = 1,66 _ 0,63. Na AIOS e em outras doenças esta relação está invertida, em decorrência da redução de células CO4.

    Imunodeficiências mistas (humoral + celular)
    Verificar as manifestações clínicas presentes já citadas nas imunodeficiências humoral e celular e os exames já mencionados na avaliação das mesmas.

    As imunodeficiências mistas caracterizam-se por alterações de imunidade humoral, celular e por manifestações clínicas próprias Imunodeficiência Celular.

    Clínica: Infecções recorrentes diversas e manifesta¬ções clínicas próprias
    Tipo: Ataxia¬telangiectasia, Síndrome Wiskott¬ Aldrich, Combinada grave, Síndrome Nezelof
    Manifestações clínicas próprias e outros dados: Ataxia, telangiectasia, deficiência de deficiência de linfócitos T,Eczema, púrpura, trombocitopenia, deficiência de IgM, deficiência de linfócitos T, Displasia tímica, deficiência de anticorpos (deficiência dos sistemas (T e B),Displasia tímica
    Exames príncipais: Dosagem de IgA e tipagem de linfócitos, Contagem de plaquetas e dosagem de IgM, Dosagem de anticorpos e tipagem de linfócitos T e B, Testes cutâneos: importantes, porém de pouco valor no recém¬ nascido
    Tratamento: Antibiótico, nas infecções, Fator de transferência, antibiótico e transplante de medula, Transplante de medula e fator de transferência, Gamaglobulina.

    Imunodeficiências Secundárias
    Após o estudo das imunodeficiências primárias, são mencionados (quadro 2) os dados referentes às imunodeficiências secundárias.
    Estas, mais freqüentes do que as primárias, em geral são de caráter transitório, pois regridem quase sempre com o desaparecimento das causas que as originaram. Constitui exceção dentre as secundárias ou adquiridas a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS = SIDA)42, pela importância em saúde pública e pela gravidade, uma vez que os casos evoluem geralmente para o óbito em até cinco anos após o início dos sintomas.

    Dados importantes para o diagnóstico da AIDS na infância

    1. Manifestações clínicas como febre recorrente, anorexia, dificuldade em ganhar peso, diarréia, astenia, poliadenomegalia, hipertrofia de parótida, hepatoesplenomegalia e infecções oportunistas, sobretudo por Candida e Pneumocystis carinii. O sarcoma de Kaposi, presente em 30% a 40% dos adultos com AIDS, é raro na infância.
    2. Epidemiologia positiva para certos grupos de risco, como hemofílicos, politransfundidos, pais toxicômanos, homossexuais, mães prostitutas.
    3. Hipergamaglobulinemia policlonal.
    4. Imunodeficiência celular com inversão da relação CD4/CD8, à custa da redução de CD4.
    5. Sorologia positiva para o HIV ou isolamento do vírus.
    6. A pneumonia intersticial linfóide crônica em crianças, confirmada histologicamente, mesmo na ausência de infecção oportunista ou de sorologia positiva, define o diagnóstico. Além desses dados, é importante excluir certas imunodeficiências raras: deficiência de adenosina deaminase (ADA) e de purinonucleosideofosforilase (PNP).

    Síndrome da imunodeficiência adquirida – AIDS ou SIDA51

    Clínica: Infecção recorrente (bacteriana, virótica) , Infecção oportunista (Candida. P. carinii), Diarréia, febre hepato¬esplenomegalia, poliadenomegalia, hípertrofia de parótidas
    Etiologia: Vírus HIV
    Laboratório: Linfopenia < 1.500/mm3, Sorologia positiva, Relação CD4/CD8 < 1,2. Hipergamaglobulinemia, Diminuição ou ausência de resposta aos testes cutâneos (PPD e outros) Tratamento: Antibióticos, Imunoglobulinas (standard ou venosas), . Tratamento infecções oportunistas, Antivirais; AZT, DDI, DDC e outros (indinavir e similares) Tratamento 41 As imunodeficiências primárias, felizmente raras, com exceção da deficiência seletiva de lgA são tratadas conforme o tipo (quadros 3,4,5 e 6). É importante frisar que o único tipo de deficiência humoral que responde ao tratamento com imunoglobulinas (standard - IM ou imunoglobulinas venosas) ou com o plasma é representado pelas hipogamas com baixa de IgG. Contudo, certas deficiências de subclasses de IgG (lgG2 , IgG3 e IgG4), com quadro de infecção recorrente de significado clínico e com nível normal de IgG, também respondem ao tratamento mencionado. Algumas deficiências de subclasses, com quadros clínicos leves, podem ser controladas apenas com antimicrobianos, durante as crises. Os pacientes com deficiência de IgA não podem ser tratados com concentrados de IgA, pois, ou já têm anticorpos anti-lgA, ou estes se formam em decorrência de terapêutica, com riscos de reações anafiláticas sérias. Uma alternativa válida é a indicação do leite humano nesses casos, sobretudo o colostro, quando ocorrem distúrbios intestinais freqüentes. A deficiência de IgM ainda não tem tratamento definido. Convém frisar que o emprego do fator de transferência e os transplantes de timo e de medula óssea estão reservados somente para os serviços especializados. Bons resultados com o emprego do fator de transferência são observados na candidíase mucocutânea. O interferon gama recombinante tem se mostrado útil nos casos de calazar resistente ao glucantime e à anfotericina B (Badaró, R. - VIII Congresso Brasileiro de Infectologia Pediátrica - Salvador, Bahia, maio de 1992)2. Por outro lado o interferon alfa recombinante foi empregado com bons resultados em pacientes de nove anos de idade, com baixa de interferon e com quadros de infecções respiratórias e urinárias de repetição há cerca de oito anos (T onelli et aI. - 1992)48. As imunodeficiências secundárias são bem mais freqüentes que as primárias, apresentam geralmente caráter transitório e regridem na maioria das vezes, com o desaparecimento da causa desencadeante. Em nosso meio, desnutrição e quadros infecciosos podem levar à imunodepressão celular, tornando as crianças presas fáceis de certos agentes infecciosos (vírus, fungos, bacilo de koch, toxoplasma, bactérias Gram-negativas e intracelulares). Excepcionalmente, pode recorrer-se ao emprego de imunomoduladores ou imunopotenciadores (levam isole, isoprinosina, BCG, Corynebacterium parvum, dentre outros) nessas circuntâncias, mas com base em testes imunológicos realizados antes, durante e após a terapêutica. Os casos de herpes genital recorrente podem ser controlados com o emprego do acyclovir durante período de um a três anos. Contudo recorrências podem surgir em cerca de 35% dos casos. No grupo controle, as recorrências foram observadas em cerca de 70 a 80% dos pacientes (Kaplowitz et ai - 1991). O tratamento da AIDS é baseado na terapêutica suportiva – como antibioticoterapia e emprego de imunoglobulinas nos casos com infecção bacteriana recorrente - na terapêutica específica de infecções oportunistas (Candida e P. carinii) e no uso de drogas antivirais: inibidores da transpticase reversa (AZT, DOI, OOC) e inibidores de proteases (indinavir, saquinavir e outros). O coquetel vem sendo utilizado recentemente (1997) em saúde pública em nosso país, possibilitando, até agora, melhor qualidade de vida dos pacientes. Estudos em andamento. NOTA: A bibliografia deste trabalho está arquivada na Academia Mineira de Medicina.