DIA DO MÉDICO – “50 ANOS DE FORMADO”
Discurso do Acadêmico Evaldo Alves D`Assumpção
Discurso proferido pelo Acadêmico Evaldo Alves D´Assumpção, por ocasião da homenagem prestada pela Associação Médica de Minas Gerias, Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais e Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, no dia do Médico, aos Médicos que nesse ano comemoram 50 Anos de formados, em 18 de outubro de 1995.
Exmos. Senhores doutores que neste ano completam suas Bodas de Ouro, nesta Maravilhosa, porém sofrida e exigente profissão médica!
Quer a tradição que caiba à Academia Mineira de Medicina a honrosa tarefa de saudar os médicos que completam 50 anos de formados, nesta festa que a Associação Médica, Conselho Regional de Medicina e Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, fazem realizar para homenageá-los.
E quis a generosidade de nosso dinâmico Presidente, Prof. Paulo Adelmo Lodi, que fôssemos nós o representante desse Sodalício, para essa saudação.
Exercendo a medicina com profundo amor e respeito, por 32 anos, não perdemos uma só oportunidade para defendê-la de quantas acusações ou calúnias são conta ela levantadas. E não são poucas nestes dias! Assim sendo, quando recebemos essa generosa atribuição, aceitamo-la pela alegria de poder homenagear a quem tanto tempo tem dedicado suas vidas, ao processo de curar quando possível, aliviar quase sempre, consolar em todas as oportunidades!
E mais fácil se fez alcançar esse desiderato, quando tomamos a lista dos 56 formandos da Faculdade de Medicina da então UMG, no ano de 1945.
Nela estão dois parentes nossos, Drs. Benjamim Alves Rabelo e José de Oliveira Costa. Estão diversos mestres que contribuíram efetivamente para nossa formação, como os professores Luiz Andrés, Janot Pacheco, Rivadáviá de Gusmão, entre outros, e o doutor Olendino Prados, com quem iniciamos na ciência e arte da Cirurgia Plástica. Entre os demais, estão amigos e companheiros dos plantões no antigo Pronto Socorro Policial; está um conterrâneo, o Dr.Wilson Massote; e um companheiro de jornada no desbravamento da Tanatologia em nosso meio, o professor Halley Bessa. Alguns desses, já nos deixaram e hoje prosseguem sua tarefa de velar pelos seus amigos, companheiros de trabalho e colegas de classe, no aconchego suave de nosso Criador e Pai.
Outros, prosseguem em sua caminhada como se o peso desses 50 longos anos, em nada lhes atolasse.
Com certeza, é a força de um ideal, a crença num futuro melhor para a humanidade, o que lhes sustenta e lhes impulsiona no prosseguimento dessa jornada.
Dezoito anos mais jovem no maravilhoso exercício da medicina é com muito orgulho e admiração que os vemos aqui reunidos para esta celebração.
Contemplando-os, ficamos a imaginar quantas vidas foram salvas pela laboriosa dedicação de cada um dos senhores. Pensamos em quantas novas vidas foram trazidas a este nosso mundo, por estas mãos hábeis e calejadas pelo exercício diuturno da arte hipocrática!
Imaginamos quantas lágrimas foram enxugadas, quantos sorrisos retomaram em rostos sofridos, quantas feridas foram curadas ao longo destes 50 anos!
Se possível fosse contabilizar todo o bem que fizeram com certeza a divida da humanidade para com os senhores, seria incalculável e impagável!
Imaginamos, por outro lado, como os senhores devem se ressentir das mudanças ocorridas nestes 50 anos, nos conceitos e na prática médica.
Sem dúvida a tecnologia transformou o mundo e a medicina não ficou atrás. Novos métodos, novos equipamentos, novos medicamentos, quantas coisas surgiram para aprimorar a arte de diagnosticar e de curar. Não há como negar tudo isso.
Contudo, ao lado das comodidades e facilidades, a tecnologia trouxe também um maior distanciamento entre médicos e pacientes. Recordamos, com saudade, nosso falecido pai, também médico, auscultando tóraces, ouvido colado nas costas de seus pacientes. Talvez a precisão dos ruídos bronco-alveolares, não fosse a mesma dos modernos estetoscópios eletrônicos, porém aquele abraço gentil, o toque pele-a-pele, com certeza trazia aos pacientes um conforto que as velhas drogas, tanto quanto as mais modernas, certamente não eram capazes de lhes dar!
Ao invés de sofisticados exames complementares: eletroforese, isótopos radioativos, cintilografia ressonância magnética; a conversa longa o questionamento minucioso, o ato de ouvir e ouvir com atenção, proporcionavam curas muitas vezes inimagináveis!
Talvez pela super-especialização que toda esta parafernália tecnológica exigiu, o médico de família o conselheiro, o amigo, o confidente e confessor, foi lentamente saindo de cena com evidentes prejuízos para a grande maioria da população. Em seu lugar, entrou o médico cibernético, movido a raios laser, repleto de números, fórmulas cientificas, olhos e ouvidos colados no computador, por isso mesmo de coração gelado e encarcerado nas masmorras do progresso insensível!
Como filhos espúrios dessa radical mudança surgiram às empresas de seguro-médico, que exploram a doença no eufemismo do “seguro-saúde”; as tabelas de honorários, onde o ato médico passou a ser codificado e classificado em USS ou CHS; e o que é mais dramático: surgiram e se multiplicaram os processos contra médicos!
Claro que não se pode negar a necessidade da fiscalização rigorosa da prática médica. Afinal, antes de sermos médicos, somos homens, portanto sujeitos a erros e imperfeições.
Contudo, a desumanização do paciente que se tomou um número, um objeto de condutas técnicas; e a desumanização do médico, que se transformou em um empregado do Estado ou de empresas, com números e estatísticas a serem cumpridos rigorosamente, criou um relacionamento médico-paciente distante e hostil. Um já espera do outro, algum tipo de agressão. E como conseqüência, qualquer suspeita já é motivo de reclamações, acusações, notícias em jornais e na televisão.
Diante desse quadro sombrio, como é gratificante se ver, vez em quando, agradecimentos públicos de familiares, muitas vezes no meio da dor de uma perda de um ente querido, ao médico ou grupo de médicos, que prestou assistência àquele que partiu.
Afinal não é nossa função salvar vidas sempre, mas sempre, aliviar e consolar!
Também é gratificante relacionarmos-nos com tantos médicos que, sejam eles os mais jovens, ou os mais experientes, não se deixaram envolver por essa avalanche de novidades, muitas elas desprovidas de qualquer justificativa ou validade.
Médicos que, sem perderem de vista a importância da atualização, do conhecimento e do domínio das novas técnicas e formas terapêuticas, preservam a essência da medicina que é o saudável relacionamento médico-paciente. Relacionamento esse que também evoluiu, hoje colocando o paciente como um cúmplice do médico e não mais como alguém a quem cabia tão somente ouvir e obedecer.
Com isso, como é agradável poder trocar idéias, discutir abertamente, descobrir as angústias e necessidades do paciente que nos procura repleto de esperanças e confiança!
A medicina que se iniciou somática evoluiu para a psicossomática ao compreender a limitação de conceitos e condutas, que somente privilegiavam órgãos ou compartimentos anatômicos isolados. O Homem, até então apenas SOMA, passou a ser visto como corpo e mente. SOMA e PSIQUÊ, e descobriu-se que a mente era responsável por grande parte dos males do corpo.
Freud, Adler, Melaine Klein, quantos não contribuíram decisivamente para que se descortinasse um novo campo para a assistência médica!
Mas, ainda assim alguma coisa continuava a faltar. Nem tudo se resolvia a contento. Parecia que novos caminhos deveriam ser encontrados.
Hoje, vemos o nascimento da nova medicina, a Medicina Holística. Aquela que descobre o Homem além do seu corpo e de sua mente. Que reconhece nele o PNEUMA, sopro do divino, o Espírito. Com isso, completa-se a compreensão do Ser Humano, formado à imagem e semelhança de Deus que é trino, portanto trino também somos nós. S0MA, PSIQUÊ e PNEUMA: Corpo, Mente e Espírito, constituindo a verdadeira totalidade do Homem Trino. E será a medicina voltada para os três pólos, não separados, mas definitivamente interligados e atuantes numa intimidade permanente, que trará a plena realização do sonho hipocrático!
Jung, Maslow, Assaglioli, Grof, Simonton Kubler-Ross, são os novos nomes que vão além do psicossomático, para abrir as portas do imensurável que é o Ser Humano em sua plenitude trina.
Esse sim é o verdadeiro progresso da medicina que não dispensa a tecnologia, mas que não faz dela uma deusa e sim uma serva obediente aos mais altos desígnios da prática médica e do legitimo interesse dos pacientes.
Senhores doutores de 1945! Perdoem-nos, se nos estendemos demasiadamente nessas reflexões filosóficas. Porém contemplando-os aqui reunidos, somos inspirados a pensar no mais puro ideal da medicina. Afinal, os senhores representam uma época de ouro da prática médica. Formados numa escola que foi considerada uma das melhores, da América Latina, em tempos onde ser médico era um estado de graça onde a competição se fazia na qualidade dos conhecimentos e da prática profissional, são os senhores um espelho em que as novas gerações de médicos devem se inspirar.
Aqueles que já partiram, deixaram sua história como exemplo. Os que ainda continuam a exercer a medicina continuam escrevendo a história e por sua pureza são responsáveis.
Em nome da comunidade médica de nosso Estado, representada aqui pela sua entidade maior, a Associação Médica de Minas Gerais, e pela Casa de Cícero Ferreira – a Academia Mineira de Medicina – queremos agradecer-lhes e homenageá-los pelo muito que fizeram pela arte e pela ciência de Hipócrates!
Finalizando, queremos dirigir uma palavra a seus familiares. Cônjuges e filhos que certamente passaram por privações, dificuldades, ausências prolongadas, enquanto o médico cumpria fielmente o seu papel. São também os senhores e senhoras, dignos merecedores de nossas homenagens. Pois, sem a companhia fiel e constante daqueles a quem muito amamos, difícil se faz ser médico em sua plenitude!
Obrigado, senhores e senhoras, pelo sustentáculo que foram da vida profissional desses que agora aqui se reúnem para nossas homenagens!
Louvamos a Deus, pela existência dos senhores, e a Deus pedimos que em sua bondade e misericórdia, derrame sobre todos, as bênçãos e graças de que são, sem qualquer sombra de dúvida, merecedores. Médicos e familiares, todos, absolutamente todos vocês!
Muito obrigado!